domingo, 31 de maio de 2009

Servidor público ou professor?


Esse texto é resultado de algumas reflexões a respeito da ação pedagógica, especialmente na escola pública. São reflexões inciais, por isso não vou entrar em maiores detalhes filosóficos e jurídicos. É apenas um olhar nascido de uma conversa sobre o trabalho.
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Nós, servidores públicos, tivemos um conjunto de atribuições e responsabilidades em Regime Júrido Único instaurados em 1990 com a Lei 8112. Mas, ao que parece, não nos foi enfatizado o verdadeiro sentido do termo "servidor público". Alessandro Eloy Braga,
colega educador, já fez reflexão brilhante a esse respeito. Ele mostra que o sentido real do substantivo "servidor" foi totalmente esquecido por aqueles milhares, ou até milhões, de brasileiros que querem ingressar no serviço público, em qualquer esfera. E eu acrescento que o adjetivo "público" nunca foi assimilado em nossa cultura em seu sentido denotativo. Não foi incorporado em nossa sociedade o sentimento de coletividade, de comunhão, de conjunto. Ao contrário, disseminou-se a noção de que público é o que pertence ao governo e o governo... É algo distante, bem distante de nós. Passamos, então, a lidar com a questão do público como o que é privativo ao outro e "eu não tenho nada a ver com isso".
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Além dessa torpe visão, tornou-se um vício ser servidor público para manter-se no emprego custe o que custar. É a tal estabilidade,
outra palavra muito mal interpretada por nós, que nos oferece esse privilégio. Aquilo que foi conquistado a duras penas e legalizado na 8112/90 como um benefício de categoria passou a ser um malefício público. É. A estabilidade garante ao servidor o direito de, após o estágio probatório de 3 anos, permanecer no cargo. A não ser por crimes previstos na Lei. O que vemos é que o servidor tem de fazer bastante esforço se quiser ser exonerado ou demitido. Mas bastante esforço mesmo!
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E o que isso tudo tem a ver com a ação pedagógica do professor da escola pública? TUDO! Nós, professores da escola pública, confundimos estabilidade com acomodação. Nos esquecemos de que não devemos apenas ensinar conhecimentos advindos do saber científico, ética, moral, respeito, comprometimento consigo e com o outro, mas também, e em primeiro lugar, devemos dar exemplo de tudo o que ensinamos.
Nos esquecemos o verdadeiro sentido de estarmos desenvolvendo um trabalho totalmente diferenciado do de um técnico da Receita Federal ou de um agente do Detran, por exemplo. Estes também devem ter consciência do que significa servir o público. Mas a natureza da atividade que cada um desses profissionais desenvolve é infinitamente diferente da desenvolvida pelo professor.
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O fato de todos nós servidores públicos nos acomodarmos em virtude de nossa estabilidade traz muitos malefícios a nós mesmos porque temos péssimos serviços públicos: hospitais públicos, INSS, Polícias, Receita Federal, Tribunais, Detran, Procon, escolas públicas, etc. Ao ponto de termos de pagar duplamente pelos nosso direitos básicos, previstos constitucionalmente - saúde, educação, segurança, habitação - se quisermos ter o mínimo de dignidade. E quem não pode pagar?
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Este texto serve a um questionamento surgido ontem quando de uma discussão sobre trabalho e transformação social. Por meio do trabalho, transformamos/dominamos a natureza e criamos cultura. Essa também é uma das razões por sermos diferentes dos animais - eles sobrevivem e isso não transforma o meio. Então, o trabalho é uma forma de dialogarmos com nossa existência, nosso mundo, nossa natureza humana e de modificar tudo ao nosso redor. Consumismo a parte, trabalhamos não apenas para sobreviver, mas para transformar e construir o mundo. Especialmente o professor, consciente ou não do poder que tem, querendo ou não, trabalha para transformar e construir o mundo ao seu redor. Resta saber se os vícios de um cultura depreciadora do real sentido de ser servidor público já impregnaram a maioria de nós. Resta saber se temos agido muito mais como reprodutores da cultura nepotista ou como contribuidores para uma sociedade mais consciente e crítica. Resta saber se temos realmente servido o público como nos é obrigatório a partir do momento em que fomos selecionados em um concurso público ou se estamos bastante interessados em receber um salário no final do mês sem importar o que fizemos com nossa obrigação já que existe uma estabilidade que me protege de um exercício irregular da profissão. Resta saber quem realmente somos. Resta saber quem queremos ser. E resta saber quem não devemos ser.


Caroline Cardoso
29.05.2009
Texto originalmente publicado aqui

terça-feira, 26 de maio de 2009

VESTIBULAR PARA OS PARLAMENTARES

Há oito dias aguardo para escrever este post. Na verdade, quero compartilhar com o leitor a queda de mais um dos meus (pre)conceitos. Explico: sempre achei que muitos, para não dizer a maioria, dos programas de humor da TV brasileira são de uma má qualidade e de um mau gosto impressionantes. [Não estou defendendo os estrangeiros. Os programas de humor ingleses ou americanos são péssimos! Depois explico isso.] Também acredito que fazer comédia, e de qualidade, não é para qualquer um. Mas há um quê de apelação em muitos desses programas brasileiros, seja para o sexo, seja para a ridicularização das minorias, seja para o desprezo ao lado cítrico-sarcástico-inteligente que deve ser a essência do humor. E, obviamente, o humor deve ser contextualizado. As piadas inglesas do Mister Bean são um horror para mim. Não as entendo [nem quero entender], por isso são tão sem graça. Mas segunda-feira passada assisti, pela primeira vez, ao CQC. E, para minha surpresa, eles fazem bom humor. Gosto muito do Tas, que comanda o programa. Ele é um rapaz cult. E isso deu um ar mais jornalístico, digamos assim, ao programa. Ao menos no quadro que vi e que reproduzo ali embaixo, eles fizeram algo bastante interessante e inédito nos programas de humor: entrevistaram os políticos, no Congresso, a respeito de conhecimentos elementares para qualquer cidadão eleito para representar o povo. E, para surpresa geral, se nossos parlamentares fossem fazer um vestibular para concorrer ao cargo por meio dos próprios conhecimentos, SURPRESA! Muitos REPROVARIAM. Fiquei impressionada com as atitudes, com a falta de vergonha dos senhores deputados e senadores pela própria ignorância. Não sei o que é pior, os desvios serem cometidos por alguém tão ignorante ou... O mais legal do programa é que o Gentili, entrevistador CQC, não precisou rechaçar os nobres colegas enternados para nos fazer morrer de chorar com tanta incongruência. Os próprios parlamentares são a piada.

Analogamente, fiquei pensando na minha profissão. Tanto que nós professores brigamos e lutamos para que nossos alunos saiam cidadãos conscientes e críticos, para que as comunidades mais carentes tenham acesso a uma Educação integral e de qualidade e para que nosso país seja mais bem representado. Como as pessoas ainda conseguem se tornar massa de manobra de gente que mal sabe o valor do salário mais pago no país? Como as pessoas ainda conseguem votar nesses homens de terno vendo tanta baboseira saindo da boca deles? Como nós ainda conseguimos nos sentir REPRESENTADOS por esse bando de ignorantes? Eu só tenho um conselho, que se fosse bom, seria vendido, não dado: ESTUDEM, NOBRES PARLAMENTARES. ESTUDEM! Eu estudo e não voto em ninguém há 6 anos. E, pelo jeito, vou continuar sem votar.



Caroline Cardoso
25.05.2009
Texto originalmente publicado
aqui